A Reserva Federal americana reduziu em 0,50% as taxas de juro, encerrando por fim um ciclo histórico de políticas monetárias agressivas que marcaram o combate à maior inflação das últimas décadas. Depois de outros bancos centrais o terem feito, por fim a FED anunciou a redução há muito esperado. O problema da inflação parece estar sob controlo. A verdade é que o ponto de viragem de um período conturbado que moldou toda a economia global, coloca uma nova questão. A gestão daqui para a frente vai focar-se no crescimento da economia e no desemprego. E a história pode não ser agradável. Incluindo para os investidores.
Recessão a caminho?
A postura do Banco Central foi firme. Na opinião de muitos analistas, demasiado firme. Defende-se aqui que a baixa de juros aconteceu demasiado tarde. e que a recessão pode ser inevitável, muito embora a economia americana transportada por um desejo de consumo ímpar no mundo, parece dar ainda assim sinais de vitalidade. Agora, com a descida dos juros, o mercado antecipa novos cortes nos próximos meses, talvez demasiados e demasiado rápidos.
Antecipamos aqui o impacto da decisão da Fed nos mercados financeiros, o comportamento dos diferentes ativos e como te podes posicionar para protegeres e maximizares os seus portfólios num cenário de incerteza que pode vir a acontecer.
Baixa de juros pode provocar baixa dos mercados?
A decisão da Fed de baixar as taxas de juros marca o fim de um ciclo de aperto monetário sem precedentes, de modo a controlar a subida dos preços, mas ao mesmo tempo colocando enorme pressão sobre empresas e consumidores. Agora, com o ciclo a reverter, muitos investidores sentem um alívio bem-vindo. Mas será que é mesmo assim?
O mercado acredita que a Fed poderá continuar a cortar as taxas de juros nas próximas reuniões, numa expectativa de seis a nove cortes de 25 pontos base ao longo dos próximos 12 meses. Mas essa visão otimista pode estar desalinhada com a realidade económica. Tal sugere um cenário quase ideal para os mercados, mas também representa uma postura arriscada. É como esperar que um navio em águas turbulentas navegue suavemente sem enfrentar nenhuma tempestade pelo caminho. Quando o mercado cria expectativas desmedidas, há um sério risco de frustração e correções severas.
Por outro lado, historicamente, grandes cortes de juros foram precursores de crises financeiras. Vimos isso acontecer em 2001, antes do colapso das dot-com, e novamente em 2008, antes da Grande Recessão. É até possível fazer comparação com o Crash bolsista de 1989.
A atual posição das taxas está perigosamente próxima desses níveis históricos, o que levanta uma bandeira vermelha. Em vez de impulsionar o crescimento económico, os cortes podem estar a sinalizar um mercado em crise, onde a resiliência da economia é posta à prova.
Na imagem abaixo, assinalado o máximo do S&P em 2007 (ponto A), com uma primeira correção e um novo máximo histórica à data (ponto B). A 18 de Setembro daquele ano, a FED iniciou a descida de juros sucessiva por um ano. E o mercado implodiu, as ações desvalorizaram, o sub prime veio à tona e todos conhecemos a crise financeira que se sucedeu em 2008.
Vamos um pouco mais atrás no tempo e reconhecer esse mesmo padrão no ano 2001. A FED começou a diminuir os juros e com isso, apesar de maior liquidez no mercado, o valor das empresas começou a diminuir também.
Agora comparemos os gráficos acima com o atual do S&P500, sendo que neste momento, tal como nas anteriores, a FED iniciou o processo de corte de juros. Algo familiar na imagem?
Os bonds sinalizam o perigo
O mercado de títulos de dívida (bonds) tem sido tradicionalmente visto como barómetro para o que se espera dos mercados de ações. Neste momento, os bonds estão a enviar um sinal claro de que algo não está certo. Com os investidores a moverem-se para ativos de segurança, como títulos de dívida e ouro, a mensagem é inequívoca: há uma preocupação crescente com a estabilidade económica e o avanço das ações num futuro mais próximo.
- O Papel dos Títulos de Dívida: Em tempos de incerteza, os títulos de dívida tornam-se um refúgio. Atualmente, a alta nos ETFs de títulos de longo prazo indica uma fuga para a segurança. Os investidores parecem estar a precaver-se contra uma possível queda no mercado de ações, com a correlação negativa entre estes ativos a fortalecer-se.
- Proteção Contra Quedas: A estratégia de diversificação entre ações, bonds e ouro é uma estratégia de defensiva por parte dos investidores institucionais. Os titulos servem como um contrapeso, protegendo as carteiras contra uma correção nos mercados de ações, o que é particularmente relevante quando o mercado começa a reagir de forma antecipada às políticas do Fed.
Ouro e Bitcoin: A Nova Corrida ao Refúgio?
O ouro, historicamente um dos ativos de refúgio mais procurados em tempos de crise, tem visto o seu valor disparar recentemente, refletindo alguma desconfiança dos investidores no futuro económico.
Mas o que é ainda mais interessante é o atraso no disparo do bitcoin após o seu mais recente “Halving” de Abril de 2024. O comboio das criptomoedas pode agora ser veículo ideal para pousar liquidez disponível numa estratégia de diversificação. Associa ao facto dos preços estarem pouco valorizados em relação ao que estiveram já no passado. Com a descida dos juros, as criptos estão a mostrar sinais de vida após um longo período de pressão descendente.
Eleições americanas, o Fator X
Estamos aseis semanas das eleições presidenciais nos EUA, que acrescentam uma camada extra de incerteza aos mercados. A política económica dos próximos anos dependerá do vencedor, e sem uma direção clara, os mercados podem continuar a navegar em águas turbulentas. Os mercados gostam de tudo menos incerteza. Tal vai criar um ambiente propício para movimentos de volatilidade à medida que se tenta antecipar o impacto das eleições no futuro.
Estratégias para navegar a tempestade?
Diante deste cenário há que ser estratégico para qualquer eventualidade. Eis algumas estratégias que te podem ajudar:
- Diversificação Extensa: Para minimizar riscos, é essencial manteres uma carteira diversificada que inclua ações, títulos, matérias primas e até criptomoedas pois ela pode ajudar-te a proteger contra perdas severas em qualquer classe de ativos específica. Podes igualmente, claro está, entrar em investimento a “shortar” esses mesmos ativos ou investir em ETFs que valorizam na ordem inversa da descida dos ativos no mercado. Estas últimas soluções não são aconselháveis a iniciantes ou no caso de seres um investidor sem conforto suficiente para entender as variáveis de funcionamento do mercado. Os períodos de volatilidade são o terreno ideal para perder muito dinheiro no mercado.
- Investir em Resiliência: Podes priorizar empresas com fortes fundamentos e histórico de adaptação a condições adversas. Empresas com baixa alavancagem financeira e receitas diversificadas tendem a resistir melhor a períodos de volatilidade.
- Foco no Longo Prazo: Apesar das oscilações do mercado, é fundamental manter uma perspetiva de longo prazo. Evita decisões impulsivas baseadas em movimentos de curto prazo e foca-te em estratégias que promovam crescimento sustentável. Lembra-te que no tempo, os ativos por norma, acabam sempre por se valorizar ao longo do tempo, mesmo após correções fortes momentâneas.
Conclusão
A recente decisão da Fed de reduzir as taxas de juros representa o fim de um ciclo, mas não o fim dos desafios. O mercado está vai navegar numa zona de incerteza, os ventos vão soprar de um lado e outro. O objetivo é que o teu barco não seja apanhado numa tempestade e naufrague.
Não é preciso ter medo, muito embora para tal é preciso perceber o que está a acontecer e porque motivo acontece. A história mostra-nos que nem sempre é possível prever os movimentos dos mercados, mas estar preparado é a melhor defesa.
é hora de ajustar estratégias, diversificar ativos e manter uma abordagem cautelosa, prontos para ajustar as velas ao menor sinal de tempestade.